Blog

/

Análises

Onde vivem as pessoas que passaram dos 100 anos no Brasil?

Análise e entrevista sobre pessoas centenárias no Brasil e os desafios do envelhecimento populacional

Marina Monteiro

1 de abr. de 2024

Compartilhe

Ainda que tenha sido executado com dois anos de atraso, o Censo Demográfico 2022 teve seus primeiros resultados lançados em junho de 2023. Todas as tabelas disponíveis até o momento estão, também, no datalake público da Base dos Dados, facilitando a análise da população brasileira. População essa que, no período da pesquisa, contava com 203.080.756 indivíduos. Veja abaixo a pirâmide etária de 2022 em comparação com a da última edição da pesquisa.

A diferença no formato de nossa pirâmide etária indica um país em envelhecimento. Não só, claro, porque as gerações mais populosas em 2010 seguem envelhecendo, mas porque nossas taxas de natalidade seguem diminuindo.

Neste país em processo de envelhecimento, o que podemos falar do topo da pirâmide? Nessa escala, que é a mais adequada para uma pirâmide etária, mal se vê o topo. Afinal, quantos são os(as) brasileiros(as) com 100 ou mais anos?

No período da pesquisa, o país contava com 37.810 habitantes centenários, representando um aumento de aproximadamente 56% em relação ao resultado apresentado pelo Censo de 2010 (24.233). Esta população representa, por enquanto, menos que 0,02% do total de viventes do país. O curioso dos dados é: estados mais populosos não são, necessariamente, os estados com mais centenários, em números relativos. Veja no mapa abaixo como está distribuída nossa população de pessoas com mais de 100 anos.

A Bahia é recorde na população secular, em números absolutos ou relativos. Cerca de 0,035% de sua população está com 100 ou mais anos, equivalente a 5335 pessoas. Em números absolutos, o segundo lugar é do estado de São Paulo, que fica entre os cinco últimos colocados quando pensamos em proporção quanto sua população total, 0,015% — menos da metade da porcentagem de centenários na Bahia.

Contrariando toda e qualquer intuição sobre o assunto, não são as regiões mais ricas a contar com maior presença de centenários. Proporcionalmente à população total − que é a análise que faz mais sentido, afinal, o sudeste tem uma quantidade de população meio surreal, as regiões Nordeste e Norte são as campeãs na presença de uma população secular. No grafico abaixo fica nítido como o Nordeste se destaca na proporção de residentes centenários.

Essa análise é um ponta pé inicial em um importante debate sobre como nossa população está envelhecendo. Para aprofundar um pouco mais, falamos sobre esse cenário e os dasafios que ele apresenta na entrevista do Trocando Dados desta edição. Convidamos você também, databaser, a enriquecer esse debate e criar suas próprias análises. Explore os dados e não deixe de compartilhar conosco ou marcar @basedosdados nas redes sociais.

Como a análise ponta, nosso Brasil está envelhecendo. Mas quais são os desafios que esse cenário traz , o significa para o planejamento de políticas públicas e por que que nosso centenários estão em maior número no Nordeste? Conversamos com Cristian Arnecke Schröder, Pesquisador Associado do GERA, para tentar responder essas questões.

Cristian é Bacharel em Economia pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Mestre em Demografia (com ênfase em População e Saúde) pela Universidade de Campinas (UNICAMP), Especialista em Planejamento de Cidades com ênfase em Saúde Pública (DCEC/UESC), Saúde Pública (UniAmérica) e Gestão em Saúde (UniAmérica). Doutorando em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade e São Paulo (FSP/USP). Pesquisador Associado do “GERA: Grupo de pesquisa em política, gestão, avaliação e regulação em saúde: Desigualdades, participação e envelhecimento nos sistemas e serviços de saúde” (FSP/USP), e também integrante do grupo de pesquisa intitulado “Demografia e Epidemiologia da Saúde e Envelhecimento” (IFCH/UNICAMP).

O que significa, para o país, ter uma população envelhecendo? Quais são as preocupações que devemos ter?

Demograficamente, podemos falar que o país está passando por mudanças na estrutura etária, oriundas de um aumento da expectativa de vida (por causa de uma redução da mortalidade infantil e pela maior sobrevivência em idades mais avançadas) e uma redução na taxa de fecundidade, que leva o crescimento populacional a um taxas que estão cada vez menores com o passar dos anos.

Esse processo é um resultado visível de políticas públicas feitas pelo Estado ao longo, principalmente, das últimas três décadas que permeiam desde a questão do saneamento básico até o investimento em tecnologias que proporcionaram crescimento e desenvolvimento econômico para o país.

Contudo, o envelhecimento é uma temática que preocupa, principalmente, pela questão da sobrecarga dos sistemas de previdência (que pode colocar a segurança econômica dos idosos em risco) e também de saúde (pelo aumento do número de pessoas que vivem mais tempo com as Doenças Crônicas Não Transmissíveis), que já começam a ameaçar os orçamentos públicos futuros para a proteção social e garantia de acesso aos serviços por essa parcela populacional.

Quanto aos centenários, quais são as necessidades específicas de políticas públicas para esta população?

A política de saúde brasileira ainda está em um estágio embrionário no que tange o pensar do cuidado às pessoas centenárias. O Estatuto da Pessoa Idosa (que é a principal Lei que fornece as diretrizes de deveres e responsabilidades para/com a população idosa) ainda é incipiente em sua formulação, uma vez que ela foi aprovada no ano de 2003 e desde então, não passou por nenhuma modificação significativa em seu conteúdo.

Uma política que deve-se ficar de olho em sua implementação, bem como, seus desdobramentos, é na Resolução Nº 729, de 07 de Dezembro De 2023 que aprovou a Política Nacional de Cuidados Paliativos, que muito provavelmente será utilizada, também, pela população centenária. Essa resolução prevê não somente uma assistência continuada para a população com saúde debilitada, mas também, prevê toda uma hierarquia de como o modelo de assistência deve funcionar para a inclusão deste idoso. Essa resolução, precisará funcionar em conjunto com outras políticas já vigentes, como a de Previdência Social. Porém, até o presente momento, não se têm muitos detalhes de como eles irão atuar conjuntamente.

Há alguma explicação bem estabelecida para o maior número de centenários na Bahia, quando comparamos os estados, e no Nordeste quando comparamos as regiões?

Não existe uma fórmula especial ou mágica que explique a grande quantidade de idosos com mais de cem anos na Bahia e no Nordeste. É uma junção de fatores que quando misturados, podem trazer este cenário.

Primeiro ponto é que, normalmente, pode-se observar que o crescimento mais elevado do número de centenários na região Nordeste é resultado de suas históricas mais altas taxas de crescimento, em face da alta fecundidade prevalecente no passado (comparativamente à atual) e à redução da mortalidade ao longo do tempo. Assim nota-se que o fato de a pirâmide etária da região Nordeste e do estado da Bahia ser relativamente mais jovem (quando comparadas com estados das regiões sul e sudeste por exemplo) faz com que o número de pessoas que estão envelhecendo mais e melhor, na região Nordeste, acabe sendo maior.

Segundo ponto que pode também explicar, é o fato das políticas públicas de saneamento, saúde e de segurança estarem ocasionando externalidades positivas a essa população que passou a ser mais assistida a partir de 2003 com a ampliação de investimentos em políticas setoriais.

Terceiro ponto é o avanço da medicina que faz com que esta parcela populacional tenha uma sobrevida com doenças crônicas muito maior que antigamente, fazendo com que esses idosos centenários morram com a doença e não em decorrência dela.

#FicaADica: Você pode conferir o código da análise dessa edição para aprimorar e criar novos recortes. Veja o código por aqui.


Notou algo errado ou tem uma sugestão?

Contribua com a BD editando este artigo via pull request no nosso GitHub.

Base dos Dados

PRODUTOS

Mecanismo de buscaDatalake públicoBD ProBD Edu

® 2025 Base dos Dados

Termos de usoPolítica de privacidade